Continuando a pesquisa aos arquivos e jornais por onde a coluna Ponto de Vista foi publicada no passado, identificamos matérias que não podem ficar fora do nosso Blog. Assim no início desta primeira década do novo século em 2001 falávamos de coisas novas advindas de transformações de coisas consagradas antigamente. . . :
. . . Conforme foi noticiado pela colunista Katia Mazão, com palavras gentis e que muito me emocionaram, na primeira edição do Diário neste novo milênio, dia 28 de dezembro completei meus cinqüenta e oito anos de vida, dos quais, cinqüenta e hum aqui em nossa querida Araguari. Agradeço envaidecido a lembrança da data e a distinção do registro em sua coluna.
Resolvi então para comemorar com minha esposa esta data (meus filhos e noras estavam viajando) almoçando fora, e para tanto, resolvi variar, fazendo uma coisa que não havia feito desde sua criação. Almoçar no Cine Rex, ou melhor dizendo, no Napolitano Self Service.
Por incrível que possa parecer, como disse acima, desde sua criação, ou seja, desde que o Cine Rex passou por uma transformação geral, tornando-se o maior restaurante que já entrei, eu não havia prestigiado meu amigo José Ferreira Machado, e sua esposa Eliane Maria Cristiano Machado, em seu estabelecimento, por uma questão de saudade, nostalgia, tristeza de ir a um local que podemos dizer crescemos, amadurecemos, constituímos família freqüentando, e agora, ver aquele local cultural e de lazer transformado em um restaurante de luxo e que possui grande movimento. Vejam que faz bastante tempo que o cinema fechou, passaram três anos sem atividades quando o Zezinho resolveu investir em 1992 em uma reforma de transformação, proporcionado ao povo araguarino um restaurante de gabarito e de excelente qualidade, e que por incrível que possa parecer aos saudosistas e nostálgicos como eu, momentos agradabilíssimos, pois enquanto deglutimos a saborosa refeição, vagamos pelo passado, na companhia de muitas pessoas que como nós freqüentaram o Rex em todo seu apogeu.
Após entrar no recinto, nos servirmos e sentarmos em uma mesa bem localizada, minha esposa e eu, como disse, saboreando a refeição, começamos a viajar no tempo e no espaço, quando disse a ela, em 1950, tinha eu 7 anos e após o almoço, ganhava uns trocados de meu pai, juntava a minha turma e vinha para cá, ao meio dia, entrar na fila para assistir às matinês que começavam a uma da tarde, mas o importante para nós, a meninada, não era o filme, mas sim os seriados que assistíamos, como Flash Gordon, O Zorro, Jerônimo, que a cada domingo levava a continuação do suspense para a tela, quebrando aquela apreensão que tínhamos pelo que ficava no ar. Quantos e quantos filmes do Gordo e o Magro, Os Três Patetas e outras comédias assistimos e que nos trazem gratas recordações. Este quadro me passou pela frente em questão de minutos, e me senti bem em estar ali, ao contrário do que sempre achei. Iria entrar em depressão. Antes de cada sessão, ouvíamos pelo auto falante que ficava em cima do Palace Hotel, (hoje ele está no arquivo público), o recital de Cítara, pelo Doutor Alex Simeck, transmitido pela Radio Araguari todos os domingos. Durante a semana era transmitida a Voz do Brasil. Não existia televisão e todo o mundo ia para a Praça Manoel Bonito passear. Tomar sorvete, conversar com os amigos. Era bom ver aquilo, era bom ver meus pais participarem e nos levarem a passear.
Mas o tempo passa, e como passa. Por isto é que gosto de lembrar do passado, para ter forças no presente e esperanças no futuro. Lá dentro, durante o almoço, olhei ao meu redor. Vi pessoas, pessoas estas que formaram famílias assim como eu, naquele ambiente, vi amigos, amigos que eram freqüentadores assíduos do Rex, então estava como se estivesse no cinema, ainda mais quando vi seu Herminio Carraro com sua esposa, senhora Mercedes Miranda Carraro (Dona Cedinha). Disse eu a minha esposa, Terezinha, veja ali que beleza, o seu Herminio e sua esposa, era ele o principal homem para o funcionamento do Rex. O maior técnico em eletrônica que já conheci, um autodidata, sem ele o cinema não funcionava. Era sistema de som, era iluminação, eram os projetores, enfim o homem era uma potência em eletrônica e braço direito do senhor Milton Lemos, dono do Cine Rex, Cine Lux e Cine Olido. O Rex na Praça Manoel Bonito, o Lux na rua Marciano Santos esquina com Padre Lafaiete, e o Olido na Praça Getúlio Vargas.
Eram três cinemas a funcionar diariamente e sempre lotados, com uma média de 1.000 lugares cada um. Era o meio de diversão da época, e o senhor Milton Lemos sempre se esmerou em passar nas telas os últimos lançamentos da industria cinematográfica. Vinha gente de Uberlândia para assistirem aqui os filmes em lançamentos.
Lembrei-me dos irmãos Gouveia, dependia deles o funcionamento sincronizado na época do Rex e do Lux, pois os filmes em grandes rolos, eram transportados em bicicletas que continha o local adaptado no quadro onde se colocava os ditos rolos, e eles tinham quinze minutos para fazerem o percurso da Marciano Santos até o Rex e vice versa transportando a magia do cinema, sétima arte a nós, felizes espectadores. Cito aqui o nome de um por um, pois sem eles não havia diversão, o esquema não funcionava, e creio eu, hoje existe pessoas da época que desconhecem tal fato. O primeiro foi Alfredo Camargo Gouveia, seguido pelo irmão Enio Camargo Gouveia, que passou a incumbência para Antonio Camargo Gouveia, que deixou para o Hélio Camargo Gouveia, deixando a incumbência ao Erezecthon José de Gouveia com a carreira se encerrando em Vicente de Paula Gouveia, o Vicente da Curinga Veículos, todos conhecem. Esses irmãos eram verdadeiros ases da bicicleta e nunca falharam em sua missão. Levaram cultura e entretenimento ao povo araguarino por vários anos. De 1955 a 1970. Os nossos agradecimentos pelo que fizeram.
Avancei mais um pouco no tempo, e já me vi na juventude. As famosas paqueras, flertes, namoros, compromissos que se tornaram muitos deles em casamentos e famílias constituídas. Lembrei-me então da primeira sessão aos domingos, era uma beleza, lá pelas cinco e meia da tarde já se via pela cidade rapazes com belos ternos, engravatados a caminho das casas das namoradas, buscá-las para a primeira sessão. Era um colorido bonito, moças elegantemente vestidas, rapazes com ternos formando formosos casais, (isto quando não se tinha que levar uma vela como companhia, o futuro sogro era bravo). Assistia-se o filme, dava-se uma volta pela cidade, comprando uma pipoca do Quinquinha, e lá ia toda a turma para a sede da U.E.A. União dos Estudantes de Araguari, (aqui na rua Afonso Pena, defronte a antiga Loja das Bandeiras) para a soarê dançante até as onze da noite, quando se levava as moças para casa e nos preparávamos para enfrentar a segunda feira.
Fluiu em minha mente repentinamente, as formaturas, do ginásio e contabilidade, pela Escola de Comércio Machado de Assis. Vi naquele palco cheio de mesas com famílias almoçando, uma garbosa mesa de formatura, formada pelo Prefeito, Juiz de Direito, Promotor, Professores, Dona Maria diretora da Escola, o Paraninfo e aquela mesa grande cheia de diplomas. Em 1962, tirei o curso ginasial, e em 1965 o de Técnico em Contabilidade, e as duas cerimônias de formaturas foram naquele palco.
Como se fosse hoje lembro-me do dia em que juntamente com Willian Braga (professor FAFI), o saudoso Elson Nunes (Guaraná Apolo) o João Mateus Filho (contador livraria São José) e outros colegas, fomos juntos, ter com o senhor Milton Lemos para contratar o aluguel do cinema para proceder a cerimônia de formatura. Tanto no ginásio como na Contabilidade, e em ambas a fineza, a elegância do senhor Milton Lemos, nos proporcionou a realização do sonho da festa que marca a vida de uma pessoa. No centro da mesa, vi o nosso paraninfo, paraninfo este nas duas formaturas, o Dr. Guaracy Faleiros Machado. Deu-nos ele a honra de nos prestigiar em ambas formaturas. Um padrinho inesquecível.
Quando disse ser o Rex um local de lazer e cultura, disse pelo fato de assistir lá espetáculos maravilhosos como teatro, shows, orquestras, recitais, como por exemplo, vimos Orquestra Cassino de Sevilha, Orquestra Tabajara, Xavier Cugar, vimos Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Tony Campelo, Aguinaldo Rayol, Caubi Peixoto, Cely Campelo, Norma Benguel, Altemar Dutra e outras tantas, mas tantas maravilhas que nem o tempo apaga, e por isto me senti bem em estar lá.
Por que não existe mais um Rex, um Lux, um Olido ???
A resposta se apresenta pelo advento da televisão, a telinha veio e acabou com tudo, acabou com uma geração, o que é lógico, é natural. É a transformação normal dos tempos. É a tecnologia que surge toma espaços ocupados por coisas que passam a se tornar obsoletas, obsoletas porém saudosas, inesquecíveis, e que nós convivemos com ele, o passado, o que vem a ser muito bom, salutar.
Araguari possui hoje mais de 100 mil habitantes. Na época dos três cinemas, possuía o que ? 30.000, 50.000 ? Não mais que isso, e comportava três casas de diversões do naipe dos três cinemas citados, e todos com mais de 1.000 lugares cada um.
Hoje, tomemos como exemplo Uberlândia que também era possuidora de vários cinemas do porte dos nossos. A população era a mesma. Uberlândia tem 500.000 mil habitantes, que não lotam um cinema de 1.000 lugares. O mesmo acontece em Araguari. Não vamos dizer que a culpa é da telinha da televisão, a culpa é nossa mesmo que estamos com a tecnologia avançando a cada momento, nos tornando mais e mais comodistas em nosso modo de viver.
No shopping em Uberlândia, me parece que existem 10 cinemas. Puxa vida, 10 cinemas ? Sim, mas cada um tem no máximo 50 a 80 lugares. É impossível lotar um ambiente para um espetáculo cinematográfico e mesmo teatral com mais de 100 pessoas. Onde chego a conclusão que não haveria solução de continuidade melhor para o magnífico prédio onde se localizou o inesquecível Cine Rex, do que transformá-lo em um espetacular, luxuoso, cômodo, com salutar ambiente de um restaurante de fino trato , excelente bom gosto com aproveitamento total do majestoso prédio todo remodelado e que traz suas linhas tradicionais juntamente com aquilo que é indestrutível e insubstituível: os dias de glória que viveu, a época que marcou.
Suas poltronas estofadas assim como os projetores foram para Uberlândia (que eu saiba), estão nos pequenos cinemas de lá. As poltronas de madeira que ficavam no mezanino do Rex, encontram-se em uso no palco auditório da Igreja Presbiteriana de Araguari, na Praça Manoel Bonito.
Surgiu assim o NAPOLITANO SELF-SERVICE LTDA, que como disse, de José Ferreira Machado e Eliane Maria Cristiano Machado. Fui até eles para contar o que senti e também para tomar informações a respeito de sua estrutura e funcionamento, para distingui-los em uma matéria, pois eles merecem, eles investem em Araguari, e qual não foi minha surpresa, quando Zezinho meu amigo de longos anos, disse que como eu, o senhor Hermínio Carraro também não freqüentava o restaurante por saudades, por lembrá-lo de 1930, quando lá morou em solteiro e já dava assistência técnica. Um belo dia resolveu ir, e agora é um assíduo freqüentador. Fiquei feliz com isto.
Visitei agora com Zezinho, as instalações do Napolitano, constatamos quatro ambiente, sendo um para eventos mais sofisticados, com 23 mesas com 4 cadeiras estofadas de luxo, perfazendo 92 lugares, é o que fica logo na entrada após a lanchonete.
Na parte central, aquele de área plana do centro, se localiza pistas de alimentos, sendo duas frias e duas quentes, uma churrasqueira, uma pista para saladas e uma para doces e geladeiras. Nesta área estão dispostas 19 mesas com 4 cadeiras em madeira de lei, perfazendo um ambiente de 76 lugares.
Na parte superior, onde era o palco, encontramos outro ambiente tranqüilo para eventos, com 17 mesas com 4 cadeiras em acabamento especial, perfazendo 68 lugares.
Possui então o restaurante nada mais nada menos que 59 mesas com 236 lugares, que podem ser ocupados indistintamente, ao gosto do cliente desde que não haja em um deles evento particular em andamento.
Zezinho proporciona 21 empregos diretos, o que quer dizer que aproximadamente 100 pessoas sobrevivem do funcionamento do restaurante, que serve diariamente 350 refeições, sendo que em dias especiais como sábados, domingos, feriados e eventos na cidade chega a servir 1.000 refeições à população araguarina e àqueles que aqui aportam.
Pudemos observar que na reforma, foram colocadas portas de vidros blindex, pisos especiais, mantendo inclusive os antigos expositores de cartazes de filmes da forma que eram, e dentro deles pinturas e enfeites próprios.
A lanchonete na entrada é das mais avançadas no ramo, tendo seus móveis em aço tubulares, cadeiras estofadas, servindo qualquer tipo de lanches.
Então meus caros leitores e leitoras, há males que vem para bem, o progresso, a tecnologia nos tirou uma casa de espetáculos, os motivos tentamos mostrá-los através de nossos comentários, espero ter alcançado o objetivo, e em compensação, ganhamos um grande e fino restaurante, graças ao desprendimento para um grande empreendimento do Zezinho Ferreira e sua esposa, que proporcionam a Herminio Carraro, dona Cedinha, a nós, e uma quantidade enorme de saudosistas, horas agradáveis no ambiente que viveram no passado, na companhia de pessoas da época, lembrando coisas guardadas lá em um lugarzinho especial da memória.
Parabéns José Ferreira Machado, parabéns e obrigado por fazer por Araguari.
É o nosso PONTO DE VISTA.
sábado, setembro 22, 2007
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Um comentário:
Um triste retrato do descaso com a história. O imponente Rex em estilo art´deco - o qual tive o privilégio de assistir alguns filmes em minha infância quando passava férias na casa da minha vó - virou apenas lembrança na memória daqueles que um dia sentaram-se em uma de suas poltronas para ver um filme enquanto saboreava uma deliciosa pipoca.
O seu tempo passou e hoje a fritura, a gordura, o azeite, a carne ao molho madeira, o arroz e o feijão, é o que tem estado em cartaz no imponente mas esquecido templo da cultura de outrora. Um crime bárbaro transformá-lo em restaurante.
O mesmo deveria ter se tornado um espaço cultural para a cidade Araguari. Função essa que hoje é "exercida" pelo guerreiro Cine Ritz, antigo Cine Apolo. Mas, na boa, não chega aos pés da imponência que foi o Rex. Apesar de, particularmente ser contrário a isso, eu preferia que o Ritz tivesse tido o destino do Rex. Se eu fosse, ou um dia viesse a ser, multimilionário, acho que compraria o REX e o traria aos seus dias de glória, como espaço destinado a cultura. Que o restaurante vá fritar batatas em outro lugar. Araguari precisa de um espaço cultural, que funcione de fato!!!
Aproveito e deixo aqui uma pergunta:
O centro cultural que foi instituído a onde era o Cine Ritz funciona??? Pergunto, pois sempre que vou a cidade ele encontra-se fechado. Apenas há a indicação de centro cultural na fachada, onde antes tinha o letreiro do Cine Ritz.
Por fim um belo post, pois conta a história dos principais cinemas de Araguari, que foram sucessos de outrora, um tempo que não volta mais.
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