quinta-feira, julho 27, 2006

OBRIGADO SENHOR


Meus caros Leitores.

Em um domingo desses que passou, logo de manhã, fomos até a padaria do Jardim dos Lemos, lá na Ki-Pão, padaria esta que já contamos a historia, e quando chegamos, encontramos tomando seu leite com café, saboreando as quitandas feitas na hora, nosso amigo e colega de Tiro de Guerra, pelos idos de 61, o Ormindo Peixoto, marceneiro, carpinteiro de renome em nossa cidade, hoje desfrutando do produzido em sua longa jornada de trabalho, ou seja, aposentado e proprietário de imóveis construídos no decorrer de seu labor.

Após os cumprimentos de praxe, lembranças de um passado lindo, pois ambos vivemos os anos dourados, desfrutando-o em seus detalhes, festas, viagens, bailes, eventos vários, excursões, cantores hoje idolatrados no exterior (desnecessário se faz aqui falar de Roberto Carlos) faziam os momentos de cada um, pelo rádio principalmente, uma vez a televisão não ser do acesso de todos e estar ainda engatinhando, mas momentos agradáveis passamos relembrando "os bons tempos", quando então comentamos, pelo fato de estarmos vendo e ouvindo os fregueses chegarem, fazerem suas compras ou mesmo tomarem o café da manhã, e quando se cumprimentavam "diziam": como vai João, como tem passado ? Ao que ouvíamos como resposta: ah José, não está bom não, ando com uma dor danada nas costas que não tem jeito. A Maria entrava, falava para a "dona Joaquina", famosa pela região, dona Joaquina, passou bem a noite, puxa vida, não dormi nada, virava para um lado, virava para o outro e nada. Acho que aquele tombo que levei na escada lá de casa estragou qualquer coisa em mim (mas ela estava toda esbelta) e dona Joaquina respondia: pois é menina (maneira carinhosa de dizer para uma senhora dos seus 60 anos) também estou uma coisa custosa. Uma dor de cabeça que não me deixa fazer nada (pelo semblante nada sentia) e não faço nada direito, dói que só vendo. A dona Francisca, com sua obesidade exagerada, ao adentrar no recinto, subindo o degrau, já resmungou para que todos ouvissem, com uma voz rouca e tossindo feito louca, com um cigarro na mão, "êta vida custosa, não posso comer um pouquinho mais que vem logo esta gordura que tanto me incomoda e faz com que eu tenha que fumar muito para emagrecer (mais tosse de pigarro e aquele fumação dentro do recinto que todos reclamaram do cheiro desagradável do cigarro. E nós que fumamos por 41 anos ininterruptos. Também já falamos a respeito, até escrevemos. Nunca soubemos que o cigarro faz emagrecer). Chegou o Paulo, outro freguês de bermudas, à vontade, tratando-se de um domingo e lógico, ficar a vontade é a premissa, queixando-se que havia tomado 9 latinhas de cerveja no sábado e parecia que seu fígado estava incomodando demais (as cervejas não tinham culpa nenhuma, foi porque comeu carne de porco), e assim foram várias as pessoas que pudemos presenciar chegando, comprando, conversando na padaria, indo embora e deixando seus problemas digamos assim, "lá no balcão", em desabafos que fizeram com seus conhecidos. Não restam dúvidas, para nós foi um acontecimento deveras interessante e motivo de uma profunda e benéfica reflexão, pois tiramos muitas conclusões, nós e o caro amigo Ormindo, após nossos comentários sobre o que assistimos naqueles momentos em que estivemos juntos no café matinal de um domingo.

Falamos então para o Ormindo, (em voz alta para que todos ouvissem e talvez refletissem um pouco, para que pensassem em Deus e agradecessem pelo que possuem sem perceber) estamos com 59 anos, levantamos cedo, vamos ao banheiro sozinho, sem ajuda de ninguém, fazemos nossa higiene e necessidades, sem ajuda de ninguém, nos vestimos, ajudamos em casa, saímos até o quintal, vemos a beleza das plantas, dos pássaros, da chuva ou do sol, tudo através da transmissão a cores que Deus poderia criar, nossos olhos, caminhamos pelas ruas, vamos a padaria, encontramos amigos, conversamos, e nos lembramos de tanto que temos e que não sabemos valorizar, uma vez ser tão corriqueiro o uso e desempenho das funções para quem nada sofre, que não percebemos o tempo passar, e quando acordarmos, veremos que estamos sendo uma carga para nossos familiares (se tivermos esta sorte de termos amigos ou familiares para olharem por nós) e aí, aí sim poderemos dar um pouco de valor a preciosa vida que temos, nos educarmos, não queixarmos de coisinhas insignificantes e que quando comentadas, só servem para nos tornar ridículos perante aqueles que nos acercam.

Só mesmo quem já cuidou de um ente, um ser humano, em sua velhice ou doença, na cama, em uma cadeira de rodas, acidentado ou pela idade avançada, acabando com o tempo, cumprindo sua jornada aqui na terra, pode avaliar o que é gozar de uma saúde, mesmo que não seja perfeita, que tenha seus probleminhas, relevantes e toleráveis. Só mesmo esta pessoa pode avaliar a benevolência do Grande Arquiteto do Universo, em sua infinita sabedoria, fazendo com que nós, criaturas de seu mundo, passemos pelo ciclo da vida, desde o momento que nascemos, nossa dependência para a sobrevivência, nossa infância, nossa juventude, nossa maturidade, nossa velhice, e o retorno aos cuidados de nossos semelhantes, assim como quando nascemos, cuja presença será indispensável para nossa sobrevivência.

Antes de retornar a nossa casa, ainda dissemos para o Ormindo: caro amigo, o saudoso Osmar de Carvalho (o Osmar Bagunça), grande amigo nosso, dizia, não quero jamais ir parar em uma cadeira de rodas ou em uma cama. Rezo a Deus para quando tiver que partir, que minha morte seja breve, não gosto nem de pensar em ficar na dependência dos outros, sentado numa cadeira de rodas lá na sala, os meninos passando, dando beliscões, tapas na cabeça e ainda ouvindo dos outros, está na hora do banho do Osmar (aí Jesus que sacrifício) ou se pior numa cama, esfregando toalhas molhadas quando de um banho, dando aquele trabalho e sofrendo o desnecessário além de fazer os outros sofrerem. Era a filosofia do Osmar. Chegou seu dia, o Osmar sofreu para partir, mas foi quase como ele pediu ao Criador. Foi uma morte serena. Saudades do grande amigo Osmar de Carvalho, o Osmar Bagunça (interessante, até hoje não o homenagearam com seu nome em uma rua da cidade, e ele fez muito por ela).

Mas aí caros Leitores, demos Graças das bênçãos recebidas diariamente de Deus, nos despedimos, retornamos ao nosso lar, rezando pelo caminho, achando tudo ainda mais belo do que antes, e sentindo-nos mais úteis por estarmos fazendo tudo sozinho, sem precisarmos da ajuda de terceiros e possuirmos saúde para desfrutar e ajudar nossos semelhantes carentes.

Caros Leitores, abrimos aqui um parêntese, para homenagearmos, e ao mesmo tempo, solidarizarmos com o conforme Dr. Marco Antônio Neves (nosso colega dos tempos do "Estadual"), o "Jornalista do Século", AFIF RADY, Diretor Honorário da Gazeta do Triângulo, pelos inestimáveis serviços prestados a Araguari e seu povo, através da profissão que abraçou durante toda sua vida: JORNALISMO. Nele trabalhou de forma digna, honrada, ética, honesta, para o bem da cidade que o acolheu. Afif Rady, um estrangeiro que como tantos outros, de naturalidades várias, abraçaram Araguari como sua terra natal, fazendo aqui o que fariam em suas origens.

Nossa terra, nosso Brasil se desenvolveu graças a determinados homens, que como Afif Rady, se dispuseram ao sacrifício de cortarem mares para desbravar terras no nosso imenso território. Aqui, como outros, ele ficou.

Trabalhou Afif como mascate, caixeiro viajante em seu Fordinho 29 (hoje relíquia), finalmente se dedicando à imprensa. Levando e trazendo informações ao povo araguarino. Cumpriu sua missão. É ele, não só o "Jornalista do Século XX", mas também do "Século XXl". Rendemo-lhes as nossas homenagens e gratidão, e ao mesmo tempo, nos solidarizamos com você Afif Rady, vítima que foi de uma impugnação ferina, em uma licitação junto a Superintendência de Águas e Esgotos – SAE, quando um dos concorrentes, apresentou a impugnação do jornal que dirigiu por longos anos, "Gazeta do Triângulo", sendo acusado de "ser estrangeiro", e por isto estar impedido de participar da licitação. De nada adiantaram os recursos, principalmente de Afif ser detentor de cargo honorífico, já haver deixado a direção do jornal que tanto ama. Os documentos da Gazeta foram devolvidos. A proposta da Gazeta seria vencedora, mas nada. A guilhotina cortou a cabeça do "estrangeiro" que carregou enquanto na ativa esteve, nossa cidade, nosso povo.

Hoje, Afif Rady, se arrasta pelas ruas, amparado por duas bengalas. Está com deficiência em ambos os joelhos além da coluna vertebral arqueada pelo peso dos anos. Circula pelas ruas, aqui, ali, comparece na sede do jornal, recebe os amigos e admiradores, e lamenta a tremenda injustiça da qual foi vítima.

Afif Rady não está como nós, independente, fazendo tudo sozinho. Depende de seus semelhantes para as atividades do dia a dia. Mas está firme, exemplar, dando Graças ao Senhor pelo que fez.

Meus caros Leitores, no dia 15/03/02, quando conversamos com o Vice Prefeito, senhor Marlos Fernandes, lá na Rádio Planalto, na presença do Alessi, do Oliro Jr., do Toni Bahia, Assessor de Imprensa da Prefeitura, conforme nos referimos na matéria anterior, abordamos o assunto "Afif Rady". Disse-nos o Marlos Fernandes: "Foi desagradável o acontecido. Precisamos zelar pelo Afif Rady, pois ele é um patrimônio araguarino". O quê mais temos a dizer ???

É isto aí caros Leitores. Um pedaço de nossa vida, vida vivida, vida que nos ensina a cada momento dentro desta escola que Deus criou e que deixamos de lado por nada sentirmos. É muito bom lembrarmos sempre Dele, elevando nossas preces e agradecimentos, por tando que recebemos contra tão pouco que damos.

Motivo de nosso Ponto de Vista de hoje, "Obrigado Senhor".

Os nomes citados, com exceção do Ormindo, foram criados por nós, pois as pessoas são nossas amigas e mesmo que não fossem, não é nossa intenção magoar quem quer que seja.

Era o que tínhamos.

Que Deus nos abençoe.

Um abraço.

(Este Ponto de Vista, foi publicado em 25/03/2002, no jornal "Gazeta do Triângulo". Motivou outros como "O Líder partiu"; "E o tempo passa"; "O peso da Cruz"; e outros mais para meditações dos Leitores. O autor.)

2 comentários:

Vera Vilela disse...

Que maravilha de crônica, viajei através do tempo em sua bela história e com tanta a ensinar. Foi muito gratificante os minutos que estive aqui lendo sua narrativa. Já me habituei a visitar seu blog e eis que me vejo tentada novamente a comentar. Parabéns pela história e pelo reconhecimento e agradecimento a Deus por poder se expressar e levar seu exemplo a tantos que se queixam sem poder comtemplar a beleza que a vida nos oferece.
Abraços

Ponto de Vista disse...

Senhora Vera, simplesmente enaltecido e agradecido pelo gratificante comentário postado por sua pessoa. Como escritora que é, sabe muito bem como é bom ser prestigiado e reconhecido por aqueles que dedicam tempo a lerem o que escrevemos. Sentimo-nos bem ao sabermos que estamos construindo algo de bom. Também somos seu leitor assíduo. Herb Life por aqui é praga. Também fugimos destas pessoas que são levadas pelo engodo do "emagrecimento" mágico. É bom abrir o Panorma e começar o dia com seu otimismo. Obrigado. Peron Erbetta.