domingo, julho 27, 2008

DEVANEIOS III

Caros Leitores.

Antes de iniciarmos este devaneio vamos destacar e agradecer as visitas que recebemos em nossa residência neste final de semana: de São Paulo capital o industrial araguarino Dr. Wiliam Rady e de Itu, interior de São Paulo o empresário Rosalvo Lima.

Rosalvo, araguarino filho do saudoso Sr. Antônio Ribeiro de Lima, que foi agente dos Correios na década de 60, assim como foi um grande orador como já pode ser visto em nosso blog onde publicamos em 14/07/08 um dos seus discursos.

Bem agora iremos conversar sobre a Escola Estadual Professor Antônio Marques.
e

Iremos contar aos caros Leitores, a nossa epopéia como participante que fomos da primeira turma da escola.

Tínhamos já feito a 1ª série do curso ginasial lá no Colégio Regina Pácis, no ano de 1956, arcando nosso Pai com mensalidades caras e que como hoje, não são nada fáceis para quem tem vários filhos estudando.

Lá em casa, éramos quatro. Três irmãs e nós. Elas estudavam no Colégio Sagrado Coração de Jesus e Maria, o Colégio das Freiras, tradicional em todo Brasil. Então era puxado e pesado para qualquer um arcar com despesas escolares para quatro pessoas.

Surgiu então o tão esperado Ginásio Estadual de Araguari, após anos de lutas políticas, que se iniciou na Câmara Municipal de Araguari, com os Vereadores de então, Lutero Vieira, Antônio Marques e Alcides Borges Marra (que se tornou o primeiro Diretor da Escola).

A mesma tomou âmbito estadual através dos deputados Lourival Brasil Filho e Oswaldo Pieruccetti, e com este trabalho foi criado o colégio, com ato assinado pelo então Governador, Juscelino Kubistschek de Oliveira, sendo que a escola só foi liberada em 13 de março de 1957.

Aí então foi um corre, corre daqueles. Onde iria funcionar o ginásio, como fazer, não poderia se perder a homologação da criação da escola, e para tanto, resolveu-se que a mesma iria funcionar nas instalações do Grupo Escolar Raul Soares. Foi uma bomba.

Como seria possível se havia aulas de manhã e à tarde ? Era necessário uma saída, pois as provas de Admissão ao Ginásio (o ensino era rígido, tinha-se que fazer provas para ver se realmente o primário tinha sido bem feito), a data se aproximava, e como se resolver ?

Não foi difícil encontrar-se a resposta, pois com a grande necessidade de um ginásio gratuito, ensino ginasial ao acesso de todas as classes sociais, era necessário o sacrifício e espírito de grandeza de muitos, e foi o que aconteceu.

Definiu-se mesmo no Grupo Escolar Raul Soares, e para tanto ficou determinado que as aulas do Raul Soares, terminariam às 16:00 horas.



As dependências da escola seriam preparadas para as aulas do período que deveria ser o matutino, se iniciasse às 16:20 horas, indo até às 19:20 horas, quando novamente era preparada para receber a partir das 19:40 horas, o período que deveria ser o vespertino, mas que na realidade passou a ser o noturno, o que foi ótimo, de bom alvitre, pois quem trabalhava poderia cursar a 1ª série ginasial.

O período noturno terminava às 23:30 horas, quando então os alunos eram liberados, e na esquina, havia a agência Studebaker, posteriormente DKW-Vemag e finalmente Mercedes Bens, da família Abdala Kedhy, que por deferência especial aos estudantes e seus pais, mantinha toda a frente iluminada para que pudessem se encaminhar aos seus lares com segurança, uma vez que os pais dos mais novos aguardavam defronte o prédio.

Traz muitas saudades lembrarmos de tudo, mas é reconfortante.

Mas aí então, como nós dissemos, tínhamos que fazer os exames de Admissão ao Ginásio, e o pessoal tinha que estar preparado. Era um vestibular. Muitos candidatos para poucas vagas, pois iria funcionar em condições precárias em prédio emprestado. Veio então a disputa de saber.

Todos os aspirantes a vagas, procuravam cursinhos que na época não se chamavam cursinhos, mas sim “turmas de reforços”, criadas nas escolas primárias, como Externato Bom Jesus, da educadora Wanda Pieruccetti, Externato Santa Terezinha, dos padres do Regina e dirigido pela educadora Maria Abud, Externato São José, da Educadora Antonia de Carvalho Barbosa (dona Tonica), e de professoras particulares.


Sem perderem tempo, nossos pais, nos encaminharam para as mãos de Dona Wanda Pieruccetti, que mantinha um quadro invejável de professoras, tendo nós sido designados para estudarmos com a professora Yolanda Ferreira (que veio a ser tornar esposa de nosso particular amigo, Fausto Tomás, hoje aposentado da Rede Ferroviária Federal, assim como ela, aposentada após cumprir longa e produtiva trajetória na arte de ensinar), que não nos deu folga.

Era trabalho em cima de trabalho, pesquisas em cima de pesquisas, o estudo da língua Portuguesa profundamente, assim como aritmética, sem contar história, geografia e outras.

Nunca tivemos que estudar tanto em tão pouco tempo, mas valeu a pena, pois chegou o dia fatídico, dia que alterou a rotina de Araguari, dado ser um fato inédito e que iria mudar o destino estudantil de nossa terra.

As provas foram realizadas lá no Raul Soares. Professores como os Patrocínio Valverde de Morais, Antônio Marques, Diva Santos, João Batista Duarte, Ernane Magalhães, Horlandi Violatti, Olegário Mendes Borges, Maria de Lourdes Reis (escritora de renome), Milza de Amorim Barbosa, Marilda Helena Vasconcelos e outros, faziam parte do corpo docente sob a direção do Professor Alcides Borges Marra.

Eles aplicaram tanto as provas escritas, como fizeram tremer nas bases cada um dos candidatos com as terríveis provas orais. Era saber ou saber.

Não existia outra alternativa. Mas passou, os aprovados foram selecionados, as turmas formadas e as aulas tiveram seus inícios.

Temos aqui que expressarmos os mais sinceros agradecimentos à professora Yolanda Ferreira da Silva Tomás, por ter-nos colocados em condições de sermos aprovados e termos participado da 1ª turma do Colégio Estadual, sendo com nossos colegas que narraremos aqui, pioneiros na fundação de tão majestoso e eficiente estabelecimento de ensino.

Hoje podemos dizer o que representava Araguari no cenário estudantil como a sexta Escola Pública do País, e a quarta de Minas Gerais, conforme comprovações de projetos realizados e enviados à então Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais.

Lembrarmos de colegas pioneiros como o Marco Antônio, nossa pessoa, Perge Rosa (hoje em Goiânia), Relva (médica em São Paulo), Mirna (filha do senhor Joanico, pintor de letras, de saudosa memória), do Abdala Abrão Salomão (trabalhava no J. Porto, mudou-se para Itumbiara onde veio a falecer), era uma pessoa espetacular.

Pelo fato de seu nome iniciar tanto o pré como o sobrenome, com as primeiras letras do alfabeto, Abdala (A+B), como Abrão (A+B), era o primeiro da lista de chamada e servia de teste para nós outros em todas as aulas por ser o primeiro.

Tinha também a Daleo Calil Daher, também médica, o Dr. Fernando Paes de Almeida, o famoso Petrarca (morto em Goiânia), o Dr. Constantino Dias da Silva, o Luiz (Ferinha), o saudoso Carlos Roberto Bittencourt, o Jair Rodrigues, trabalhava no Correio, o José Rodrigues, foi de mudança para Brasília, trabalhava na Vasp.

O grande exemplo de todos, o senhor Joaquim Floriano Lemos, aposentado do Banco do Brasil e empresário, foi estudar quando teve oportunidade na época, e uma gama de outros colegas que o tempo nos apaga da memória, mas quando os vemos, vêm à tona, de forma saudável e alegre, trazendo-nos a alegria de termos convividos juntos.

Íamos nos esquecendo. Aos sábados, para compensar os horários das aulas semanais serem menores pelo fator tempo, tínhamos aulas, sendo o período da tarde das 08:00 às 11:00 horas, e o período da noite das 13:00 às 17:00 horas.

Era o melhor dia, pois havia mais tempo para contatos, amizades, trocarmos conhecimentos, ouvirmos histórias dos professores que vinham de Uberlândia (pela estrada do Pau Furado), vinham de guarda pó, terno e gravata. Eram os professores Horlandi Violatti e Olegário Mendes Borges.


O corpo docente da escola mantinha com os alunos, um clima de cordialidade, de amizade, compreensão, cremos nós, hoje, após analisarmos os tempos, de vermos e sentirmos o sacrifício de cada aluno em busca do saber, do valor de cada um, de cada sacrifício feito sabemos o que passou.

Vivíamos em um clima de harmonia, de grandes amizades, um compreendia o outro, sempre querendo se ajudar mutuamente, sem disputas em ser o primeiro, mas coesos em vencermos juntos.

Dr. Marco Antônio Neves, na época o Marco Antônio, certa feita, idealizou e concretizou com a ajuda da direção da escola, de colegas e até do comércio local, um jornal.

Sim caros Leitores, um jornal para aquela turma de primeira viagem, ou melhor, de primeira série. Este jornal era de cunho seríssimo, contendo matérias várias, de gente grande. Noticiário geral da escola, matérias de alunos com temas de reflexões, estudos, diversões, entrevistas, piadas, coluna social, esportes, enfim um jornal que marcou época.

Chamava-se “O Estadual”, tendo como diretor, redator e redator chefe, o próprio Marco Antônio. Ocupávamos o cargo de gerente. Contávamos com a colaboração de todos os alunos e dos professores.

Era editado e impresso na tipografia São José, e sua circulação era em toda a cidade, não se restringindo apenas na escola. Possui Marco Antônio, guardado a sete chaves, toda a coleção preciosa de cada exemplar.

Mas o Ginásio Estadual era novo, e nós não compartilhávamos das comemorações em datas significativas e comemorativas da cidade.

Regina Pácis, a Escola de Comércio, o Colégio das Freiras participavam, colocando seus alunos nas ruas em desfiles comandados com suas belas fanfarras, ficando o nosso Ginásio Estadual representado apenas por alguns alunos uniformizados e que eram designados para representar o Ginásio nas solenidades.

Ora, não poderíamos deixar as coisas daquele jeito. Nossa escola tinha até jornal, coisa que os outros não tinham, e na hora de desfilar não tínhamos uma banda, uma fanfarra.


Como sempre, Marco Antônio e nós, juntamente com outros alunos que tomavam frente de tudo, levantamos a questão. Nos reunimos com o Diretor, os professores, e partimos para a aquisição de nossa banda.

O Estado não dava verba para tal finalidade, a escola não tinha como arrumar, então nós, os alunos, os intrépidos alunos, resolvemos levantar o dinheiro, a verba para comprarmos os instrumentos.

Para tanto, foi feita uma rifa, rifa de uma caneta “Parker 21”, dentro do estojo, uma beleza. Vendemos todos os bilhetes, e por incrível que pareça, correndo pela Loteria Federal. Quem foi o premiado?

Foi justamente o Marco Antônio Neves, o idealizador do rifa para termos a banda. Tudo bem. Rifa corrida, prêmio entregue com solenidade, dinheiro levantado.

Partimos nós para a compra dos primeiros instrumentos lá em São Paulo, da hoje espetacular fanfarra que a Escola Estadual Professor Antônio Marques possui e que demonstrações em exibições em várias cidades realiza, além de ser a mais destacada de Araguari.

Compramos dois surdos, um bumbo, duas caixas de guerra, um tarol e foi só, o que o dinheiro deu.

Os instrumentos chegaram em Araguari. Marco Antônio era o “chefe da banda”, pequena mas nossa, tínhamos nossa banda, iríamos desfilar com banda própria.

Nos lembramos bem, caros Leitores, Marco Antônio pegou o tarol (verdadeiro mestre no repique, ritimista de mão cheia), nós ficamos com o bumbo (cremos por sermos o maior da turma) e fomos nós treinar com afinco para desfilarmos no 7 de Setembro de 1958.

Este não passou em branco, ficou devidamente registrada a presença do Estadual pela rua Ruy Barbosa, garbosamente dentre as demais escolas.

Nossa banda era pequena. Se sobressaiu pela sua peculiaridade de ser pequena, porém com rítimo e cadência, além do belo uniforme que usávamos, calças azuis marinho com camisas de mangas compridas e golas olímpicas brancas.

Para nós, era o máximo, a realização de um sonho. Para o povo, a prova da garra de uma juventude em busca de um ideal.

Mas não nos demos por satisfeitos. No ano seguinte, fizemos outra rifa, desta feita, uma bicicleta, não nos lembramos da marca, não foi o Marco Antônio que ganhou não, foi gente da cidade, não nos lembramos quem. Uma vez mais, solenidade na entrega do prêmio.

Dinheiro levantado, procedemos a compra de instrumentos de sopro. Foram seis cornetas adquiridas juntamente com três tubas, além de mais meia dúzia de tambores e mais dois tarois. Agora sim, tínhamos uma pequena fanfarra.

Marco Antônio continuou a treinar os instrumentos de percussão, e o inspetor de alunos, hoje advogado em Goiânia, Dr. Jonalvo Alamy, filho o saudoso Dr. João Alamy Filho, o advogado dos Irmãos Naves, foi ser o instrutor dos instrumentos de sopro.

Ficou uma beleza, foi idealizado um novo uniforme, calças azuis marinho, camisas olímpicas, porém amarelas, como o nome do Estadual na frente, com um grande periquito nas costas.

Aí sim, aí nós abafamos. Desfilamos e fomos aplaudidos por todos que assistiram. Fomos homenageados pela escola com medalhas pelas vitórias conquistadas, a aquisição da banda e o garboso desfile, igualando-nos às demais escolas, não só nos estudos, mas também nas comemorações cívicas.
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São passados 50 anos. Jubileu de Ouro. O Estadual ganhou prédio novo na Av. Minas Gerais 2273. Sua denominação passou a ser de um daqueles mestres que tanto lutou por ela. Escola Estadual Professor Antônio Marques.
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Uma infinidade de alunos recebem a luz dos ensinamentos de mestres gabaritados. O prédio é imenso. Possui de tudo. Das salas de aulas a ginásio poli esportivo. A banda, a pequena e humilde banda que nós formamos, hoje vem a ser o famoso “Trovão Azul”, ficamos ao vermos tudo isto.


Colégio Estadual, estudamos nele, lecionamos nele, nossos filhos por ele passaram. Gerações e gerações recebem os ensinamentos nele, e dele partem para a vida. Nos orgulhamos dele.

Nossos cumprimentos por Araguari possuir um estabelecimento de ensino deste naipe. Estabelecimento este que prepara o aluno para enfrentar vestibulares e seguirem carreira profissional. Dele também saem excelentes profissionais que por um motivo ou outro, não continuam os estudos. Estão aptos a seguirem em frente.

Então, é isto aí caros Leitores, em nosso Devaneio III, pudemos trazer até vocês um pouquinho da fundação do Estadual, orgulho araguarino, fruto da luta de homens que muito fizeram por nós.
e


Fica aqui a promessa que em outros Devaneios, traremos a todos mais detalhes, pormenores deste orgulho do ensino araguarino, a Escola Estadual Professor Antônio Marques.

Contaremos sobre seus diretores, professores, alunos, homens que se destacam por este Brasil imenso, pelo exterior, e que tiveram suas bases lá, naqueles bancos, com ensinamentos de abnegados professores, de corpos docentes que passaram e que estão gerindo os destinos da cultura de nossa gente.

Chegamos assim caros Leitores, a mais um Ponto de Vista, feito com amor, com carinho, procurando mostrar como foi o início de grandes coisas que possuímos.

Araguari é uma cidade de cultura. Possui um grande número de pessoas célebres e que devem ser citadas. Com o passar dos tempos, é nossa intenção destacarmos uma por uma.

Era o que tínhamos.
Que Deus nos abençoe.
Um abraço.
Fotos: Arquivo pessoal / Google Earth

3 comentários:

Balaio The Gato disse...

Quase choro ao ler este post,estudei por um ano no Estadual(86),acho que foi a melhor escola que já estudei(sempre estudei em escola pública),meu pai estudou lá,inclusive tivemos o mesmo professor de Ciências.Sempre tinhamos que mostrar a caderneta pra entrar,o uniforme era conferido,inclusive meias, e o famoso "guarda-pó" .Abraço,
Fábio Galante

Noeme disse...

Amei este devaneio. Caminhei junto com você pelos corredores e salas do Colégio Estadual de 1963 a 1970, ano que terminei o curso normal neste estabelecimento. Nunca me esqueci desta escola, deste tempo de estudante. Foram anos maravilhosos.
Obrigada por me levar por este passeio feliz. Abraços.
Noeme

Ponto de Vista disse...

Pessoal muito obrigado pelos comentário.
O conteúdo desse blog foi criado e mantido pelo meu pai, até que em 2009 ele partiu. Continuo mantendo o blog ativo justamente por saber que os textos do meu trazem registros e boas lembranças.
Ficamos gratos pela atenção do acesso e comentários.
Abraços.
Julio Erbetta Neto